Muita gente já se pegou fazendo testes online para verificar o tipo de personalidade que possui. Com o fácil acesso a esses conteúdos na era digital, é comum que as pessoas saiam fazendo diagnósticos baseados em formulários e questionários encontrados na internet.
Cabe salientar que, esses conteúdos disponibilizados na web não são uma ferramenta científica para o diagnóstico de transtornos de personalidade, sendo de extrema importância a busca por profissionais de saúde para o entendimento do quadro do paciente.
Uma das alterações de personalidade mais conhecidas nos dias atuais é o transtorno de personalidade esquizoide. É interessante que pessoas que convivem com pacientes acometidos com essa alteração aprendam a lidar com as características típicas apresentadas pelo transtorno.
Movimentos de exclusão como o bullying, que costumam acontecer com pacientes esquizoides, devem ser extintos. Enquanto atitudes de empatia e inclusão, buscando entender as limitações de cada um, devem ser valorizadas. Agora vamos conhecer melhor as características desse transtorno de personalidade.
O que é transtorno de personalidade esquizoide?
O transtorno de personalidade esquizoide (TPE) pode ser definido como um modelo de comportamento que apresenta características de isolamento e distanciamento social. Os indivíduos com esse transtorno podem ser vistos socialmente como estranhos e frios.
O desinteresse pelo estabelecimento de relações sociais e a preferência por realizar atividades sozinho leva o sujeito a ter sérias implicações na esfera social e laboral. É comum que essas pessoas sejam excluídas ou se excluam das atividades sociais, principalmente pela marcante indiferença que eles possuem na realização dessas atividades.
A pessoa com esse transtorno, pode ser confundida com outros transtornos como a esquizofrenia e o autismo. A esquizofrenia apresenta algumas similaridades com o transtorno de personalidade, contudo, o esquizofrênico apresenta sintomas psicóticos graves que não estão presentes no TPE, como os delírios.
Já no autismo, as características que diferem do esquizoide tem relação com a maneira como as emoções das outras pessoas são percebidas. O autista tem dificuldade em reconhecer as emoções, enquanto o esquizóide simplesmente as ignora por puro desinteresse.
Quais são os sintomas e sinais da esquizóide?
Algumas características estão muito presentes nos pacientes com TPE. Os pacientes com esse distúrbio costumam evitar o contato com pessoas, até mesmo de familiares, e fazem isso por simplesmente não possuírem o desejo de manter relações sociais.
Além disso, é comum que elas não possuam uma rede de amigos, e dificilmente iniciem relacionamentos amorosos. Não apresentam interesse pela prática de atividade sexual, tendo em vista que, isso demanda interação social e experiências sensoriais que não são atividades agradáveis para esses pacientes.
Esses indivíduos também apresentam pouca expressividade, ou seja, não costumam demonstrar sentimentos de alegria ou tristeza, além de gostarem de realizar atividades que possam ser feitas só, sem nenhum tipo de interação social.
Comumente os sintomas presentes nesse transtorno se mantêm estáveis e sem grandes alterações. É durante a infância ou na adolescência que eles começam a se manifestar. Inicialmente pais ou cuidadores podem pensar que a criança só é mais solitária que o normal, contudo, com o passar do tempo esses sintomas começam a interferir no rendimento acadêmico e nas relações sociais de maneira mais acentuada.
Como identificar um paciente com transtorno esquizoide?
É a partir da observação dos comportamentos dessas pessoas que as principais características desse transtorno podem ser identificadas. A presença de ansiedade social se dá em decorrência do estresse provocado pelas situações de interação social que não podem ser evitadas. É comum os pacientes se sentirem coagidos e amedrontados mesmo em situações que não apresente nenhum risco aparente.
Esses indivíduos também apresentam um discurso próprio, muitas vezes sendo difícil para que os outros compreendam aquilo que ele diz. A fala pode ir de extremamente refinada até uma fala vaga e sem sentido, isso vai variar de paciente para paciente.
Os pensamentos mágicos também podem estar presentes no transtorno. Eles podem ser definidos como a busca por alternativas para escapar de situações que geram ansiedade e desconforto, nesses casos a pessoa pode substituir a realidade por fenômenos sobrenaturais criados no pensamento.
Além das características que já foram citadas, outros aspectos também podem estar presentes neste tipo de personalidade, como: a hipersensibilidade, as ilusões e as ideias de referência.
Não existe um exame laboratorial capaz de verificar a presença desse transtorno, logo, o diagnóstico é realizado a partir da análise clínica do paciente e do histórico comportamental apresentado pelo mesmo.
Quais as causas da esquizoide?
Atualmente não existem grandes estudos que comprovem a causa do desenvolvimento do transtorno de personalidade esquizoide, contudo, acredita-se que fatores genéticos e ambientais estejam por trás da manifestação do quadro.
Os fatores genéticos podem ser observados na manifestação da doença em pessoas que possuem familiares com o mesmo transtorno ou com outras disfunções mentais como a esquizofrenia.
Já os fatores ambientais podem ter importante influência na personalidade esquizoide, tendo em vista que, problemas na gestação ou negligência afetiva durante a infância podem levar o sujeito a ter uma imagem distorcida sobre o que constitui as relações sociais, contudo, essas hipóteses ainda estão no campo da especulação.
São necessários mais estudos sobre essa temática para que possamos entender melhor a causa da doença e, quem sabe, encontrar formas de prevenção e melhoria na qualidade de vida dos pacientes.
Principais traços de personalidade esquizoide
Além de traços como desinteresse no estabelecimento de relações sociais, apatia, pouca expressividade de emoções e sentimentos e preferência por atividades solitárias, alguns estudos levam em consideração os 5 traços de caráter baseado na estrutura do corpo e trazem outra visão sobre o TPE.
Essa teoria foi desenvolvida por um dos discípulos de Freud, o médico e psicanalista austríaco Wilhelm Reich. Ele dividiu os sujeitos em 5 tipos corporais e explicou a maneira como eles determinam o tipo de caráter da pessoa.
O primeiro tipo é o esquizoide formado pelo grupo de pessoas com corpo magro, longo e com cabeça avantajada e que apresentam uma personalidade mais contida, tímida e voltada para o intelecto.
O formato de corpo oral é constituído por pessoas que costumam estar acima do peso, o caráter desse grupo é mais guiado por fatores emocionais, ou seja, são mais sensíveis.
O corpo masoquista é mais quadrado e apresenta uma personalidade mais expansiva e comunicativa, conseguindo manter boas relações sociais, mesmo tendo algumas limitações emocionais.
O formato rígido é caracterizado por um corpo atlético e musculoso e possuem uma personalidade que sempre busca fazer o melhor, têm metas desafiadoras e miram na perfeição.
Por último, temos o corpo psicopata que apresenta formato triangular com ombros largos e uma personalidade persuasiva, com espírito empreendedor, sempre atentos na busca pelo lucro.
Segundo a teoria, cada traço de caráter se desenvolve em decorrência de uma dor vivenciada pelo sujeito, são elas:
- Esquizoide – rejeição,
- Oral – abandono
- Masoquista – humilhação
- Rígido – exclusão
- Psicopata – manipulação
É importante salientar que a teoria não busca uma relação de culpabilização com os cuidadores com relação ao sofrimento experimentado pela criança, a teoria vai buscar entender a maneira como essas dores inevitáveis e necessárias são importantes para a constituição do caráter do sujeito.
Desinteresse em relacionamentos
O desinteresse no estabelecimento de relacionamentos é uma das características mais marcantes no quadro desse tipo de transtorno. Como os sintomas começam a se manifestar ainda na infância, é comum que os pacientes não consigam desenvolver habilidades de interação social.
Essa dificuldade traz repercussões durante a vida escolar e nas experiências de trabalho do sujeito. A ocorrência de bullying é alta em pacientes esquizoides que não buscaram um tratamento para melhorar as habilidades sociais, tendo em vista que, as pessoas têm dificuldade em entender um comportamento de retraimento dos esquizoides.
Preferência por atividades solitárias
Outra característica muito presente no esquizoide é a busca por atividades que possam ser realizadas de maneira solitária como a leitura, navegar na web, jogar videogame e assistir filmes e séries em casa.
Além disso, o sujeito pode buscar profissões que não demandem contato social, como, por exemplo: tradutor de textos, artigos e livros em outros idiomas, alguns trabalhos na área de tecnologia e escritor, isso pode dificultar a inserção no mercado de trabalho, tendo em vista que, o contato social, mesmo nessas ocupações pode ser necessário.
Frieza emocional
Uma pessoa com transtorno de personalidade esquizoide têm muita dificuldade para expressar suas emoções, apresentando um comportamento frio e indiferente. Mesmo as situações extremas, que normalmente trariam grande sofrimento para a pessoa, são encaradas com frieza e falta de sentimento.
Grande potencial de imaginação
O paciente esquizoide costuma exibir uma imaginação fertil, com a presença de pensamentos mágicos e ideias de referência. Também pode acontecer situações onde o sujeito não consegue diferenciar a realidade da imaginação.
Além disso, alucinações e ilusões podem se manifestar promovendo alterações nos sentidos, principalmente na audição, que é a região sensorial do corpo mais afetada em casos de alterações do juízo de realidade.
Quais são as possibilidades de tratamento para a esquizoide?
Como vimos, não existem muitos estudos voltados para o entendimento do transtorno de personalidade esquizoide, contudo, algumas alternativas podem ser levadas em consideração para o tratamento.
Como as pessoas têm uma tendência a não procurar ajuda médica nesses quadros, a busca por um profissional de saúde costuma demorar, nos casos em que acontece. Além disso, as dificuldades de interação social também vão se manifestar no ambiente terapêutico, dificultando ainda mais o processo de tratamento.
Nesse contexto, é importante a busca pelo estabelecimento de um bom relacionamento terapêutico com esses pacientes, caso contrário, eles podem se sentir motivados a abandonar o processo.
Como esses pacientes têm mais chance de desenvolver comorbidades, como transtornos de humor, é importante ficar atento aos sintomas que se manifestam para buscar ajuda dos profissionais de saúde o mais rápido possível.
A utilização de técnicas da terapia cognitivo comportamental é uma boa opção no tratamento do transtorno, onde é possível desenvolver habilidades de interação social, facilitando o convívio com as pessoas.
Também é importante procurar entender o histórico familiar e as experiências vividas pelos pacientes. Isso ajuda na hora de buscar o tratamento mais adequado para cada caso específico. As perguntas variam entre questões da infância, relacionamentos e histórico profissional.
Além das intervenções baseadas na terapia cognitivo comportamental, também podem ser utilizadas técnicas grupais, terapias alternativas como a musicoterapia e tratamento medicamentoso voltado para a melhora de sintomas comórbidos.
Em casos de transtorno de personalidade esquizoide pode ser necessário internação?
Nem sempre o tratamento de transtornos de personalidade vai demandar a internação do paciente. Nos casos em que a psicoterapia e o uso de outras ferramentas de tratamento se mostram efetivas para a melhora do quadro do paciente, não existe a necessidade da internação.
É essencial o acompanhamento do psicólogo e do médico psiquiatra para verificar os progressos realizados pelo indivíduo e, principalmente, qual o momento certo de realizar a internação quando necessário.
Quando o paciente precisa ser internado, é de extrema importância que a família procure uma clínica especializada e de confiança, garantindo dessa forma, o acesso a um tratamento adequado para a melhora dos sintomas.
O tratamento incorreto ou mal executado pode ser muito prejudicial para o progresso do tratamento, dificultando o retorno do paciente a suas atividades normais.
Conclusão
Vimos que o transtorno de personalidade esquizoide traz muitas implicações para a vida das pessoas que convivem com ele. Nesse sentido, é de extrema importância entendermos os mecanismos que estão por trás do quadro com o intuito de buscar as melhores alternativas para o tratamento, aumentando a qualidade de vida dos indivíduos diagnosticados.
Também observamos a maneira como o corpo pode explicar algumas manifestações no comportamento do sujeito, contudo, é importante lembrar que o uso dessas teorias deve ser realizado por profissionais capacitados que saibam dar o sentido correto para as produções teóricas dos grandes autores da psicologia.
As possibilidades de tratamento do TPE são variadas, contudo, o transtorno não tem cura, tendo em vista que não é possível modificar a estrutura do sujeito. O uso de medicamentos surge como uma alternativa para diminuir alguns sintomas como estresse e ansiedade que podem surgir em decorrência do quadro.
Destacamos que o respeito às diferentes formas de existência no mundo é importante para um bom convívio social. Compreender que o outro pode ser diferente e respeitar as limitações de cada um pode ajudar a motivar o sujeito na busca por novas formas de superar os desafios impostos pelo transtorno.
Fabrício Selbman é Diretor do Grupo Recanto, rede de três clínicas de tratamento de dependentes químicos referência no Norte e Nordeste nesse segmento, e também é:
- Formado em marketing e pós-graduado em gestão empresarial;
- Especialista em Dependência Química pela UNIFESP. Especialização na Europa sobre o modelo de tratamento Terapia Racional Emotiva (TRE);
- Psicanalista pela Associação Brasileira de Estudos Psicanalíticos do Estado de Pernambuco (ABEPE);
- Professor de Especialização na Associação Brasileira de Estudos Psicanalíticos do Estado de Pernambuco (ABEPE);
- Diretor do Grupo Recanto, rede de três clínicas de tratamento de dependentes químicos referência no Norte e Nordeste nesse segmento.