Um dependente químico passa por muito sofrimento. Até mesmo antes de se tornar dependente, ele já passou por algum evento traumático, que ocasionou o seu vício. A dependência é algo avassalador que traz grandes riscos à vida do ser humano, bem como a da sua família.
Por conta deste estado, o dependente foca tanto em suprir seu vício que acaba se opondo à sociedade, se isolando, sendo agressivo com seus familiares. Podem haver, inclusive, ocasiões em que o dependente saia de casa para ficar na rua e, sem financiamento, a sua solução para suprir o vício muitas vezes é roubar.
Cometendo atos contra a sociedade em seu tempo de “fundo do poço”, é necessário programas que promovam a ressocialização de dependentes químicos, pois de nada adiantaria reabilitá-los sem ajudar com seu comportamento ante a sociedade.
É preciso ter em mente que a dependência causa danos irreversíveis em nossa estrutura psíquica. O sujeito se torna mais agressivo, impaciente, pode acabar tendo recaídas e a ressocialização faz com que a incidência desses atos diminua.
Ressocialização de dependentes químicos: o que é?
A ressocialização de dependentes químicos é um processo que tem como objetivo devolver o indivíduo dependente químico que se afastou da vida social, ou que representava um perigo para a sociedade, evitando recaídas e promovendo sua participação na esfera coletiva.
Durante o processo, a equipe trabalha suas questões de relação para com a sociedade, promovendo sua saúde mental. Dentro do tratamento na clínica, o indivíduo participa de práticas educativas para que, quando se recupere, consiga entender sua função na sociedade e possa exercê-la.
Importância da reinserção social do dependente
Após passar por episódios de dependência, muitas vezes o paciente entende que não se encaixa no meio social, ou que não serve o suficiente para exercer alguma função. Isso acaba por deixá-lo marginalizado, podendo ocasionar casos de depressão e até mesmo suicídio — o sujeito se vê como um ser que não tem valor.
É aí que se vê a importância dessa ressocialização do dependente químico. Com ela, o paciente se sente parte de algo.
Depois de passar por eventos traumáticos, em que pode ter perdido a família, amigos e o emprego, com essa reinserção ele pode vir a achar sua função, trabalhar em cima disso e participar do meio social, melhorando seu quadro.
Impacto da Estigmatização na Ressocialização
A estigmatização social enfrentada pelos dependentes químicos representa um dos principais desafios no processo de ressocialização. Este aspecto negativo pode dificultar significativamente a reintegração desses indivíduos na sociedade e afetar sua recuperação de várias maneiras.
A estigmatização pode levar à exclusão social, prejudicando as relações familiares, amizades e oportunidades de emprego. Os dependentes químicos podem se sentir desvalorizados e desencorajados, o que pode impactar negativamente sua autoestima e motivação para buscar ajuda.
Além disso, o estigma pode criar barreiras ao acesso a serviços de saúde e apoio, tornando mais difícil para os dependentes químicos obter o tratamento e o suporte necessários para sua recuperação.
Eles podem se sentir julgados e rejeitados, o que pode aumentar o risco de recaídas e perpetuar um ciclo de dependência.
É importante reconhecer os efeitos prejudiciais da estigmatização e trabalhar para combater preconceitos e promover a inclusão.
Isso inclui aumentar a conscientização sobre os desafios enfrentados pelos dependentes químicos, desafiar estereótipos e criar ambientes mais acolhedores e solidários para apoiar sua ressocialização e reintegração na sociedade.
Estratégias de reinserção social de dependentes químicos: confira
Para que o dependente tenha uma vida após o processo de internação é preciso que ele tenha oportunidades para sua ressocialização. Dessa forma, o paciente poderá exercer funções dentro da sociedade, fazer novas relações e reconciliar-se com aqueles que ama.
Mas para que esse processo tenha êxito é preciso ter um plano estratégico que assegure um bom resultado. Essas estratégias contemplam desde a interação familiar, até um novo começo no mercado de trabalho.
Mas, claro, tudo deve ser acompanhado por psicoterapeutas, para que esses profissionais consigam entender o que o paciente está passando na sua volta à sociedade.
Interação familiar
É na família que o paciente encontra seu primeiro grupo social após sua recuperação. É nela que o paciente vai confiar, ela que dará amparo a esse sujeito em meio às novas dificuldades que virão.
É com a ajuda da família que vai surgir no indivíduo o sentimento de pertencer a algo, e isso é de grande importância pois, por meio desse sentimento, ele vai se sentir mais seguro para a grande luta contra seus vícios e recaídas.
Terapia
A terapia é algo que idealmente deve estar presente na vida do paciente antes, durante e depois do processo de recuperação.
Nela, o paciente vai ser incentivado a se reconhecer, promover autoconhecimento, saber seus limites, achar o que ele pode fazer com esse novo começo, com uma nova gama de possibilidades em suas mãos.
Na terapia o paciente vai entender seu comportamento, saber porque ele age de tal modo e tentar superar questões traumáticas que aconteceram em sua vida.
O acompanhamento com um profissional pode também ajudar o paciente diante de seu comportamento dentro da sociedade, pois as sequelas deixadas pela dependência podem deixar esse processo mais lento. Com o devido apoio, o sujeito vai aprender a deixar suas relações sociais mais saudáveis.
Como ajudar na ressocialização de dependentes químicos
Dentro do processo de ressocialização o adicto pode encontrar vários desafios. É preciso ter em mente que, enquanto dependente, ele pode ter causado grandes transtornos a várias pessoas ao seu redor.
Quando ele se encontra dentro do processo de reinserção, podem haver alguns acontecimentos que o façam querer desistir. Uma grande carga emocional é gerada ao ter que se deparar com novos desafios, perdões, conflitos e preconceitos.
Por isso, em sua recuperação, é fundamental que ele tenha ajuda daqueles que o querem bem, para que possa praticar saudavelmente sua cidadania.
Incentivo
O paciente ainda tem vulnerabilidade, tanto fisiológicas como emocionais, e qualquer abalo como brigas e frustrações pode trazer para o dependente a vontade intensa de usar drogas novamente. Os entorpecentes são usados como instrumento de fuga daquela realidade.
Sendo assim, diante desse cenário, o paciente precisa estar acompanhado de suportes que o incentivem a continuar habilitado, apoiando-o para que continue com suas sessões de terapia.
A família deve interagir com ele mostrando que o caminho que está sendo trilhado tem muitos benefícios.
Acolhimento
O acolhimento é fundamental para proporcionar um ambiente seguro e faz com que o paciente se sinta bem para as novas batalhas que surgiram com a adicção.
O processo de terapia é essencial, já que esse campo acolhedor forma um indivíduo capaz de enfrentar seus monstros, pois ele sabe que ao seu redor existem pessoas que vão ajudá-lo, caso se sinta mal consigo mesmo ou angustiado.
O acolhimento faz o dependente se sentir parte de algo e mostra para aquelas pessoas seu agradecimento, o que pode incentivá-lo a levar uma vida melhor.
Mercado de trabalho
O mercado de trabalho representa um grande desafio, pois nele o dependente vai encontrar alguns preconceitos.
Por outro lado, um ambiente saudável pode promover a esse paciente uma função para exercer dentro da sociedade. O trabalho valida o homem, além de também ajudá-lo financeiramente para que ele possa resgatar sua independência financeira.
Esse trabalho traz para o dependente o sentimento de capacitação. Depois de estar no fundo do poço, ele se sente funcional, capaz de exercer algo que traga benefícios tanto para si quanto para os outros.
Ao se sentir útil, sua autoestima é promovida, assim como sua confiança. Mesmo havendo algumas dificuldades no ambiente de trabalho, quando o indivíduo consegue superá-los, ele também entenderá o seu valor e vai aprender a se valorizar e a vencer desafios.
Educar e sensibilizar
É importante educar e sensibilizar a comunidade sobre os desafios enfrentados pelos dependentes químicos durante o processo de ressocialização.
Promover uma compreensão mais ampla e empática sobre a natureza da dependência química e as necessidades dos indivíduos em recuperação pode ajudar a reduzir o estigma e criar um ambiente mais acolhedor e solidário para sua reintegração.
O que acontece quando ocorrem recaídas?
O processo de recaída ocorre quando o dependente consome as substâncias causadoras de sua dependência na fase de recuperação.
Acontece que as recaídas estão muito ligadas a questões emocionais, como uma autoestima baixa, processos estressantes e conflitos familiares.
Como o dependente usa sua substância química para escapar da realidade, esse processo também condiz com a escapatória desses sentimentos que trazem desconforto. Por isso, ao invés de trabalhá-la emocionalmente, a recaída surge como um instrumento de fuga daquela dor.
Portanto, a recaída deve ser vista como sendo parte do processo da recuperação, muitas vezes passamos por situações e tentamos nos autossabotar.
Clínica de reabilitação e ressocialização de dependentes químicos: como funciona
As clínicas de reabilitação e ressocialização de dependentes químicos contam com uma equipe multidisciplinar.
Quando o paciente chega nesta clínica, ele passa por momentos de avaliação médica, psiquiátrica e psicológica para que identifique a causa de seu vício, suas enfermidades fisiológicas, psicológicas e como medicá-las.
O dependente passa por um período de abstinência, para limpar seu corpo, e logo depois começam as sessões terapêuticas dentro da clínica para que ele consiga trabalhar suas angústias e superá-las.
Junto com o trabalho da equipe multidisciplinar, ocorrem reuniões em que são trabalhados os 12 passos e também são incentivadas práticas integrativas do paciente com o ambiente.
O paciente também ajuda em algumas funções com seus companheiros de internação, como organizar as cadeiras de reunião, limpar ou varrer o ambiente da clínica. Essa prática ajuda o dependente a encontrar uma função e a interagir com os integrantes da clínica de modo saudável.
Conclusão
A ressocialização de dependentes químicos se mostra um instrumento crucial para o paciente se sentir realmente reabilitado, dar função a sua vida e conseguir conviver na esfera social.
Caso essa ressocialização não seja feita, o paciente pode desenvolver sérios problemas de autoestima, desconfiança, desvalor, entrar em depressão, ter uma eventual recaída e ter até mesmo riscos de suicido causados por essa exclusão.
A família exerce o papel mais importante, o ambiente acolhedor inicial é crucial para dar esse caminho para o novo começo, para que o paciente possa encarar novos desafios e volte, pela ressocialização, a praticar suas novas habilidades sociais, promover seu bem-estar, sua autoestima e confiança.
Fabrício Selbman é Diretor do Grupo Recanto, rede de três clínicas de tratamento de dependentes químicos referência no Norte e Nordeste nesse segmento, e também é:
- Formado em marketing e pós-graduado em gestão empresarial;
- Especialista em Dependência Química pela UNIFESP. Especialização na Europa sobre o modelo de tratamento Terapia Racional Emotiva (TRE);
- Psicanalista pela Associação Brasileira de Estudos Psicanalíticos do Estado de Pernambuco (ABEPE);
- Professor de Especialização na Associação Brasileira de Estudos Psicanalíticos do Estado de Pernambuco (ABEPE);
- Diretor do Grupo Recanto, rede de três clínicas de tratamento de dependentes químicos referência no Norte e Nordeste nesse segmento.